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Brega & Chique

Este é um blogue de uma mulher portuguesa com todas as (f)utilidades inerentes a essa condição...

Reeditando "antiques": «Coisas que uma pessoa faz e pensa quando não apetece fazer nada»

 

     Sabem aqueles dias em que até temos muitas coisas para fazer (e algumas importantes) e não nos apetece fazer rigorosamente nada? Aposto que sim… Aposto também que, tal como eu, inventam outras que supostamente até têm prioridade ou então, distraem-se com coisas completamente estapafúrdias…

     Quando eu andava na universidade, obviamente que a época dos exames era a mais crítica e era aquela altura em que a única coisa a fazer era estudar. Porque tínhamos os exames para fazer e porque como toda a gente estava a fazer o mesmo, não se passava muita coisa de portas para fora… Isto, para o comum dos mortais, claro. Na minha casa, as coisas não funcionavam bem assim. Pelo menos comigo e com a minha "compincha". Exceções à parte, curiosamente, era nessa altura que apareciam imensas coisas para fazer.

     A primeira coisa era encher a despensa. Pois claro. Quem é que consegue estudar se tem que interromper sistematicamente o estudo para ir comprar provisões? Ninguém, claro. Era necessária a máxima concentração e ter à mão tudo o que eventualmente precisássemos, fossem alimentos, café, chocolate… enfim, uma resma de coisas absolutamente desnecessárias e que, por vezes, até se estragavam…

     Depois da despensa atafulhada, por qualquer razão desconhecida até então, subitamente, constatávamos que a casa estava toda virada. E que alminha se poderia dedicar ao estudo sem ter um ambiente limpo, organizado e arrumado? Era “mãos à obra” e faxina de alto abaixo, transformando a casa num ambiente hospitalar.

     Após estas providências, começávamos, então, a olhar (de soslaio) para as resmas de fotocópias. Como até então nem sequer tínhamos lido uma linha daquilo, havia que organizar tudo, encadernar algumas coisas e arranjar outras (que nunca lemos) para termos tudo devidamente catalogado e completo.

     Quando esta trabalheira toda acabava (às vezes durava dias e dias a fio), era natural que estivéssemos cansadas e então púnhamos o sono em dia, para que as horas de estudo rendessem melhor. Isto acompanhado de grandes almoços e jantares para fortalecer o organismo.

     Restava-nos, então pegar na porra dos livros, mas não sem antes tomarmos um café na famosa mesa da cozinha e fumar uns cigarritos para relaxarmos e “agora é que era”.

     Contudo, ao lamentarmo-nos de termos que ler tanta chachada, havia sempre um assunto que se impunha e que dava para noites inteiras de discussão. Era a solução de todos os nossos problemas: o totoloto (na altura não havia euromilhões)…

     “O que é que fazias se te saísse o totoloto?” era a pergunta curta cujas respostas longas duravam (providencialmente) uma eternidade. Embora o principal se mantivesse, as variações dessa simples pergunta faziam as nossas delícias e faziam-nos esquecer as pilhas de folhas que estavam à nossa espera. Ríamo-nos, ficávamos tristes, sonhávamos… e lá íamos para a cama, porque já era tarde.

 

     Dei por mim hoje a fazer o mesmo, embora, em vez do totoloto, tenha sonhado com os milhões de euros do euromilhões… Ai o que eu fazia… Pior que naquele tempo, pois graças a estas modernices, dei por mim a visitar páginas de cruzeiros para a Grécia, entre outras coisas… É de uma pessoa ficar com água na boca, a babar em frente ao ecrã e, por momentos, pensar que pode tudo…

     Depois acorda-se, claro, mas sente-se ainda aquele gostinho… e depois, como continua a não apetecer fazer nada, escreve-se este artigo para dar a sensação de que se fez alguma coisa.

Reeditando "antiques": «Temos pena - parte 2»

 

A propósito do artigo «Temos pena», cá vai mais um que se enquadra na temática abordada.

   Todas nós (e todos) sabemos o que custa “levar com um pé na bunda”. Especialmente se estivermos mesmo apaixonadas. Ainda mais se foi uma paixão de adolescente. Nessa altura, tudo é levado ao extremo e a nossa autoestima desaparece nesses escassos segundos em que somos “dispensadas”. Com o tempo “a coisa” é digerida, mas fica lá sossegadita. Se se tiver a sorte do gajo desaparecer da vista, está-se melhor e nunca mais se pensa no “trauma”. Ouve-se esporadicamente notícias da personagem, sabe-se que ele se casa, que até já teve filhos, que se separou, que voltou a casar, enfim… e nada disso a afeta já. Simplesmente acha caricato. Até que…

   … Numa bela noite em que vai pôr o paleio em dia com as amigas, vê entrar o dito cujo porta dentro do bar em que se encontra. Cochicho geral (claro está) e rapidamente as amigas tomam conhecimento da ocorrência. Tudo no gajo é passado a pente fino (of course...) e você conclui, radiante, que ele piorou bastante. Esta constatação é, normalmente, acompanhada de uma sensação de conforto e de satisfação. Portanto, com este facto lá volta aquela autoestima perdida há 20 e tal anos atrás.

   O caramelo, acompanhado por um amigo (o que revela logo que “algo vai podre no reino do casamento dele”), deita os olhos ao redor e repara em si. Como até agora não a tinha visto, você teve tempo para ser surpreendida, reagir e voltar ao normal. Ele não. Faz um esgar de surpresa, olha de alto abaixo e abre um sorriso acompanhado de um “olá” efusivo. Está visto, a batalha está ganha. Você, pelo contrário, dirige-lhe um olá rápido, para não ser indelicada e volta-se para a amiga. Os dados estão lançados.

   Pelo que as amigas lhe dizem, o fulano não pára de olhar e já comentou com o amigo. Coitado. Pensa que você cresceu por fora, mas por dentro continua a ser “a lorpa”. Sem dúvida, ele está a pensar na melhor estratégia para a abordar, mas como covarde que é, não ousa aproximar-se, porque não está sozinha.

   É aí que você vai convenientemente ao w.c. (pensa ele). Quando volta já pressente que o cromo lá estará à espera e é dito e feito. Lá está ele de sorriso aberto e de cabeça espetada para os dois beijos da praxe e o paleio do costume, tipo, “O que é feito de ti?”, “Estás melhor ainda” e etc, merdas que nem ao Menino Jesus lembram (mas o que estes gajos têm na cabeça?!). Você vai respondendo evasivamente e o gajo, em desespero de causa, lá lhe diz que se arrependimento matasse, blá, blá, blá...

   É aí que o entala: “Estás a falar de quê, mesmo? Não estou a perceber…”. Ele lá se embrulha todo a falar do passado, com pormenores românticos perante o seu olhar propositadamente confuso. Depois de o deixar estender bem a manta, simplesmente responde-lhe: “Tens uma memória fantástica, parabéns! A única coisa que me lembro é que realmente se passou alguma coisa entre nós, mas deve ter sido apenas uma coisa de crianças, porque nem fazia a mínima ideia do que estiveste para aí a dizer. Que engraçado! Olha, não me leves a mal, mas as minhas amigas estão à minha espera… gosto em ver-te” e vaza.

   Curiosamente, não é que o indivíduo passa a noite a beber como um camelo (que é e sempre foi) e não tira os olhos de si?!? Temos pena…

 

Reeditando "antiques": «O gajo problemático»

 

Minhas queridas: estou aqui hoje para vos falar desta variante de gajo, bem como para ver se alguma alminha iluminada me consegue dar umas dicas de como lidar com esta estirpe. De todo o tipo de gajo que conheço, este tem vindo a desenvolver-se proeminentemente nos últimos tempos, mas, como se trata de um fenómeno menos estereotipado e ainda menos óbvio, o seu estudo torna-se difícil, senão mesmo impossível.

 

Longe e saudosos vão os tempos em que éramos nós (as gajas) as complicadas. Éramos nós que não sabíamos o que queríamos, que nunca estávamos bem com o que tínhamos e que alternávamos os nossos humores de um momento para o outro sem razão aparente. Éramos assim porque éramos gajas e “as gajas são umas complicadas”, diziam eles e estava a coisa explicada. Então, por que razão aparecem cada vez mais estes sintomas nos gajos? Será porque, agora, nós sabemos o que queremos (e não temos medo de o dizer) e eles assustam-se? Será porque já não dependemos deles para nada e isso os deixa sem o papel de macho? Ou estarei eu aqui a fazer psicologia barata e a culpa é das alterações climáticas e dos genes malucos? Ou estarão mesmo os gajos a ficar malucos? Ou a querer fazer de nós malucas?...

 

Vamos aos factos: como caracterizar este gajo. O gajo problemático não se identifica à primeira vista, o que é logo um inconveniente muito grande. Enquanto que um fdp é facilmente topado à vista desarmada, com este gajo a coisa não procede do mesmo modo… e mais: não é imediata. Embora possam ocorrer alguns pormenores que nos possam alertar para este tipo, estes não são evidentes e não são decisivos para a catalogação do mesmo.

 

Duma coisa pode estar certa: este menino é um traumatizadinho, quer isso tenha fundamento ou não. Ou seja, mesmo que aquilo que o perturbou seja a coisa mais normal do mundo, este gajo acredita mesmo que foi (e é) um desgraçadinho. Os traumas podem ser de diversos tipos: a morte de alguém, a traição sofrida, o sonho que não concretizou, as dificuldades económicas por que passou, a exclusão social que sofreu, ter sido feio… sei lá. Whatever… e podem vir isoladas ou conjugadas (o que ainda é pior). E quanto mais tempo tiver passado sobre o trauma, pior é, porque o gajo (consciente ou inconscientemente) vai moldando e exagerando a causa do seu infortúnio ao ponto da memória do facto estar completamente distorcida da realidade. E mais: nem sequer tente minimizar as suas desgraças. Isso só vai fazer com que ele se afaste de si, porque isso fá-lo-á encará-la como alguém que não o compreende e que também só o quer é magoar, e que está a menosprezar a sua dor, etc, quando, na verdade, você pensa que só está a tentar ajudá-lo a superar a crise. É que o problema com estes gajos é esse. Ele NÃO quer realmente superar o problema. No fundo, é este seu sofrimento atroz que lhe dá prazer, tendo o gajo consciência ou não deste seu gozo.

 

Numa primeira fase, não se nota nada de anormal neste tipo. É um gajo absolutamente normal, que se aproxima de si duma forma natural e interage consigo e com os outros como se nada fosse. Contudo, depois da fase da aproximação ocorrer, começam os sinais mais visíveis. De um momento para o outro, depois de até aí se mostrar uma pessoa absolutamente normal, abre a boca e desembucha os pormenores da sua vida mais íntima, as coisas que supostamente nem com os amigos ou com a psicóloga desabafa. Em suma, conta-lhe tudo. Tudo, ao ponto de lhe contar coisas que nunca se devem dizer a uma gaja, sobretudo a uma com quem se “está”. E tudo duma vez, como uma tempestade tropical. Num momento está tudo muito lindo e muito soalheiro e logo a seguir está o oposto: a chuva é cerrada e nada de bom se vislumbra.

 

A pessoa fica a modos que embasbacada, e num esforço, consegue articular umas frases de conforto e de positivismo, tentando contrabalançar com algo de bom para compensar. O gajo cala-se e concorda passivamente e fica a pensar-se que o assunto está resolvido ou em vias disso. Enfim, o normal. Mas, na mente distorcida deste cromo não é assim…

 

A coisa passa (ou julga você que passou) e parece-lhe que tudo voltou a entrar nos eixos. Parece-lhe… Até que, de um momento para o outro, depara-se com reacções opostas e atitudes inconciliáveis… Ora o gajo lhe pede calma, ora está a falar de filhos e afins; num momento leva a relação de uma forma ligeira, no outro tem uma crise de ciúmes sem motivo nenhum; num dia nem um telefonema ou uma mensagem, no outro entope-lhe o telemóvel e deixa-a acordada até às tantas da manhã com mensagens ridículas; diz-lhe que as coisas têm de ir devagar quando está consigo, e depois liga-lhe a dizer que só lhe apetecia arrancar-lhe a roupa… Oremos, irmãos.

 

Quando confrontado com estes devaneios, o que o gajo faz? Fica amuado, claro! Whatelse? Se possível, mostra-se mais magoado ainda. Claro… Você é que é a insensível, é óbvio (para ele, claro…)! Você é que não compreende… As coisas são complicadas, não são assim tão simples… Talvez um dia você o compreenda… Sim, está certo que sim, que um dia compreenderá tudo. Mas, por agora… é muita coisa. Ele até compreende que você não compreenda… enfim… e você ainda vacila ali um momento (ou mais…) a puxar por todos os neurónios e todos os conhecimentos de psicologia que possui, a navegar na sua bola de cristal para ver se consegue ver o que ainda não viu, a descortinar todos os fragmentos das conversas que teve com ele para ver se lhe escapou alguma coisa importante ou se não deu a devida importância a alguma coisa, enfim, quase a delirar junto com ele… até que… numa altura em que se consegue distanciar um bocadinho mais desse grande problema que está a viver e que não é seu (nem dele verdadeiramente), dá-se conta que está a embarcar numa relação psicótica e que nem sequer tem formação para isso.

 

E é aí que você, completamente esgotada mentalmente e já quase a precisar também dum psicólogo, decide deixar de aturar gente tola, acorda para a vida, “entrega a Deus” e volta a apreciar as coisas simples da vida, em vez de viver em função de um guião escrito por um gajo problemático que, em vez de aproveitar a vida, se entretém em complicá-la.

 

Gajos problemáticos: tratem-se! Away...